Repórter passa uma semana em spa radical e emagrece 4,5 quilos

Texto: Juliana Vines (Folha de S. Paulo)
"A dieta daqui é tão restrita que seu corpo vai achar que você está morrendo", disse a enfermeira. E me mandou tirar a roupa para a primeira pesagem, a única em que ela é autorizada a falar o peso do paciente em voz alta.

O ritual da balança deve se repetir todo dia sob pena de o interno ficar sem jantar, avisa a placa no Spa Med Sorocaba Campus, onde passei uma semana vivendo com 300 calorias por dia.

É menos do que uma pessoa normal come no café da manhã. É o mesmo que dois pãezinhos sem margarina.

Famoso por lendas de tráfico de comida, o Spa de Sorocaba disciplina gordos à base de regras rígidas, diárias salgadas (partem de R$ 595 e a estada mínima é de sete dias) e dieta hiper-restrita.

Tudo lá é controlado, até folhas de alface. Só escapam refrigerante zero, água, chá, café e suco light, além de picolé de gelo feito com o suco.

Nada mais entra, nem o inocente chiclete sem açúcar que tinha na bolsa, confiscado na revista de boas-vindas.

"Vocês pegam muita comida escondida?", perguntei às moças que me escoltaram até o quarto e fuçaram minha mala. "Sempre", disse uma.

Depois, ouvi de internos (nada de hóspedes por lá) histórias de doce de leite em frasco de xampu e torta de frango no filtro de ar do carro ("Ainda chega quentinha").

Hora Feliz
Primeiro jantar. Seguindo as instruções da enfermeira terrorista, escolhi sopa. Sábio conselho. Apesar de ter muita água e um cubo de frango de 3 cm, o prato estava cheio. Com salsinha e limão, ficou uma delícia.

A comida do spa não tem nada de sal, açúcar ou gordura. As 300 calorias/dia são repartidas em seis refeições, que de novo são divididas no almoço e no jantar entre entrada, prato e sobremesa. Milagre da multiplicação? Não.

A porção de arroz é menor do que um copinho de café, e a sobremesa, do tamanho de uma caixa de fósforos.

Há quem tenha o privilégio de comer 450 calorias. Dá direito a um café da manhã melhor e ao dobro dos lanches da tarde e da noite (no meu caso, meia fatia de pão com um nada de patê ou três tomates-cereja, você escolhe).

Há ainda a primeira classe das 600 calorias (idosos, grávidas, veteranos e "fracos" em geral), que pode comer dois pratos no almoço.

A mim e aos companheiros de fome restava descobrir qual era a coisa mais bem-servida do dia e sublimar as preferências pessoais.

Aprendi a não cair na cilada dos nomes apetitosos. Disse não ao nhoque (eram oito unidades), ao hambúrguer e à minipizza. Optei por arroz integral com frango ou legumes, os pratos maiores.

Já a decisão de trocar sobremesa por salada era mais difícil. Adotei a tática de sobrevivência de me concentrar na quantidade (o pedaço de doce equivalia só a uma garfada) e esquecer que estava substituindo bolo prestígio por um pouco mais de alface.

A barganha por comida corre solta no refeitório - gigantesco e nada glamouroso. É um bisbilhotando o prato do outro e todos patrulhando a dieta alheia, querendo saber por que a comida do vizinho tem um aspargo a mais.

No café, há quem "estique" sua única fatia de pão cortando-a na horizontal. Outros poupam todos os lanchinhos do dia para um banquete noturno regado a refrigerante zero do frigobar.

Passado o choque inicial, o segundo e o terceiro dias foram tranquilos. Já tinha perdido dois quilos e estava bem. Só sentia fome perto da hora de comer e antes de dormir.

No terceiro dia, quase todo mundo que tinha entrado comigo no spa já havia trocado de dieta. Sim, qualquer um pode pedir para comer mais caso se sinta mal.

Eu, brava, passava duas horas na academia entre esteira, bike, dança e hidroginástica. Nada mal para uma sedentária acima do peso.

Tudo estava sob controle até que, na madrugada do terceiro para o quarto dia, sonhei que fazia um caça-palavras com expressões do spa. E me animei ao encontrar laxante no meio das letras. Era o primeiro sinal de loucura.

Mais tarde, descobri que tinha engordado cem gramas. Quem me contou foi uma companheira de spa que viu um exame meu por engano. Era o que faltava para que eu entrasse na histeria coletiva.

Por que engordei? Cada um tinha uma teoria. Para uns, eu estava bebendo pouca água; para outros, faltava tomar mais chá de gengibre ou trocar de dieta para dar um "choque" no organismo.

Todos contavam a própria via-sacra. O interno, querendo ou não, fica sabendo quem está com intestino preso e quem toma diurético. Para dar mais raiva, sempre tem um homem que diz estar perdendo um quilo por dia.

Na manhã seguinte, decidi ir ao clínico do spa para afastar os palpites e tentar recuperar a sanidade. Segundo ele, eu não precisava de diuréticos ou laxantes e não deveria trocar de dieta porque tinha perdido mais 900 gramas. Ufa. Prometi não olhar o peso até o último dia.


Estrategias de Fuga
A prisão no spa torna as coisas proibidas mais gostosas. Já as permitidas... "No último dia você vai odiar gelatina", profetizou a copeira que atua como fiscal do lanche e não deixa o posto nem por um minuto. Tinha razão.

Quem sai do spa sob licença médica, permitida depois de sete dias, só pensa em dar uma escapada. O programa preferido é comer a coxinha de uma padaria sorocabana.

De volta da licença, o paciente é pesado. Se tiver ganho mais de 2% do peso, perde o direito à voltinha.

Outro evento é a ida ao cinema. Cercados por monitores e com sacos de pipoca sem sal fomos levados ao shopping num micro-ônibus apelidado de "transbanha".

Notei a falta de duas pessoas na fila. Claro: driblaram a vigilância e foram comprar sanduíches, degustados no escurinho do cinema.

Não cometi nenhuma infração, mas quase. No final, a fome apertou. No quinto dia estava tão faminta que fiquei imóvel na beira da piscina, depois da aula de hidro.

Foi a única vez que precisei de transporte para voltar ao quarto. Mas não desmaiei.

Na consulta final com o médico, a notícia: perdi 4,5 quilos, 3 cm de barriga e 2,5 cm de cintura - não revelo o peso nem sob tortura. Minha taxa de glicemia, que era 108 (pré-diabetes), baixou para 99, o limite da normalidade.

"Se você comer quatro vezes o que comeu aqui, vai continuar emagrecendo", disse o médico. É o truque do spa para tentar deixar você feliz com uma dieta de mil calorias. Tem funcionado.

Não perdi um número no manequim, mas minhas roupas estão mais largas. No mais, descobri que não sou tão molenga para exercícios.

De alta, na volta, minha primeira providência foi comer uma esfirra em uma lanchonete na estrada.



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